Por Mateus*
*Nome fictício. O autor deste texto pediu para não ter sua identidade revelada.
Nos últimos anos, a concessão de licenças de radioamador para uso em satélites tem sido erroneamente interpretada por responsáveis por missões como uma maneira fácil e barata de regularizar suas operações satelitais de forma rápida. No entanto, essa interpretação equivocada, muitas vezes intencional, desvirtua o verdadeiro propósito das missões científicas e de comunicação radioamadorística em prol de interesses individuais.
Alguns exemplos recentes ilustram essa problemática:
- Na primeira missão, conduzida por uma universidade do centro-oeste, um satélite 1U foi lançado com licença de radioamador, incluindo um digipeater para uso dos radioamadores. No entanto, durante os mais de 2 anos de missão, o digipeater nunca foi ativado. O satélite completou sua missão (de interesses próprios) reentrou na atmosfera esta semana sem que sua missão radioamadorística fosse concluída.
- Na segunda missão, realizada por uma universidade do norte do Brasil, houve tentativa de uso da banda de radioamador para fins comerciais em embarcações, através da venda de localizadores na banda de 70cm para rastreamento.
- Na terceira missão, conduzida por um grupo privado do centro-oeste do Brasil, busca-se o uso de um satélite artístico sem qualquer missão científica ou voltada para o radioamadorismo, visando apenas os custos mais baixos de licenciamento disponíveis para radioamadores.
Esses exemplos são apenas a ponta do iceberg desse problema. Anualmente, surgem novos projetos que buscam utilizar nossas bandas de frequência para interesses próprios, muitas vezes comerciais ou até mesmo relacionados à industria militar, disfarçados como atividades amadoras.
A Agência Nacional de Telecomunicações tem enfrentado desafios em sua capacidade operacional e técnica para avaliar essas missões, o que pode impactar negativamente a reputação internacional do Brasil, como ocorreu em abril de 2022 com a IARU por conta de denúncias anônimas de uma missão lançada pelo brasil no mesmo mês.
É preciso que os Radioamadores estejam sempre vigilantes para que nossas faixas não sejam utilizadas de modo indevido. Para isso, é preciso fortalecer os laços entre a Agência e nossa representante, a LABRE, que no Brasil também representa a entidade maior, a IARU, de forma que essas missões sejam devidamente esmiuçadas para que qualquer desvirtuamento do Serviço Radioamador possa ser prontamente identificado e coibido.
Ao mesmo tempo, é preciso mostrar ao setor privado e à Academia o que de fato significa e quais os propósitos de uma genuína missão Radioamadora para que nosso Serviço não seja indevidamente utilizado apenas como um “meio”, mas sim como um “fim”, para benefício não só dos Radioamadores, mas de toda a sociedade por meio do papel que o Radioamadorismo tem como incentivador do estudo nas áreas STEM.
fonte: https://qtc.ecra.club/2024/04/satelites-radioamadores-ou-comerciais.html